terça-feira, 22 de julho de 2008
sábado, 19 de julho de 2008
A(s) minha(s) criação(ões), ipsis verbis
Às vezes gosto de pensar que é a vida que nos permite os encontros com meras pessoas boas, futuros amigos e amigas e que tantos e tão fortes e bons momentos nos proporcionam.
Não poucas vezes dou por mim a pensar que se não tivesse ido a tal parte, não teria conhecido tal pessoa que se tornou importante na minha história privada e que passará incógnita para grande parte do mundo, mas nunca para mim.
Alguns desses encontros vêem-se a revelar grandes desencontros, mas sempre com peso, bom ou mau e que por qualquer destas vertentes, me influenciou, mudou alguma coisa, fez-me ter sempre presente algo ou alguém ou uma situação que deveria reter e reter e reter.
Não gosto de pensar que tudo decido. Apesar de nunca ter acreditado no destino e no facto de termos a nossa passagem escrita e que apenas nos limitamos a percorrer os caminhos que nos estão reservados. Também não gosto de pensar que somos donos e senhores de tudo o que fazemos, temos ou podemos vir a ter, que podemos livremente decidir tudo o que nos diz respeito ou poderá vir a dizer. Gosto de um misto dos dois...
Gosto de sentir que o acaso de encontrar alguém importante, é bem mais saboroso e misterioso do que escolher a dedo esse ser e alaparmo-nos a ele como nosso desejo, consentido que foi da outra parte. Estendo isto a todos os outros pormenores da vida, os que se sentem e por isso se consentem e os que se projectam e por isso se amam, com o amor de um progenitor, de um criador, de um ser omnipresente e todo poderoso, naquele aspecto de uma vida imensa e incontrolável.
Gosto muitas vezes de perseguir objectivos, de ter os nervos à flor da pele e sentir a raiva de querer atingir o fim, rápido, mais rápido, já, para me sentir útil, poderoso, gerador de uma realidade que poderá vir a ser aproveitada por alguém e sem nos darmos conta, termos influenciado não só a nossa existência, mas a de quem se cruzou com esta criação nossa. Chamar-se-á destino?
Outras há em que gosto de me sentar, relaxar, sentir a pulsação das criações dos outros, do poder que elas teriam sobre mim se eu lhes tivesse a dar tal importância naquele momento ou do poder que detêm no global dos seres, por variadas razões. Desde a moda, até às convicções, passando pela solidão e incarácter vincado, tudo vale.
Deixai vir até mim o ruído inconsequente do mundo, o rumor das batalhas de criações a disputar o papel principal de um palco que não o é, num espectáculo que há muito deixou de o ser, que eu escuto-o, ao longe, de longe.
Que estou à espera, eu.
Acabei de criar algo.
Deixai ver se alguém repara que aqui estou sentado, todo poderoso, montado naquilo que agora acabei de criar, à espera de entrar na batalha de criações, acredito que, vencedor orgulhoso!
sexta-feira, 18 de julho de 2008
segunda-feira, 7 de julho de 2008
Triste, tocante
Falava com os meus progenitores de tempos idos, de amigos passados, de bons momentos vividos. É sempre bom recordar. Mesmo que esses tempos para mim se difundam no nevoeiro das lembranças que tenho de ainda pequeno. Lembro-me de pessoas, coisas e lugares, mas não com a nitidez que com o passar dos anos as memórias se vão afincando teimosamente a nós.
Como as conversas são como as cerejas, acaba-se sempre por falar da vida e de quem ainda pisa a face da terra e dos outros que já foram contribuir para que a crosta terrestre continue a alimentar as árvores e toda a espécie de flora que nela cresce. Indirectamente, nós também. E num desses momentos...
Recordou-se um amigo que me recordo vaga mas firmemente, pelo bom espírito e doideiras fazia, sempre bem disposto e na brincadeira, que teve a infelicidade de ver falecer um filho pequeno. Mais pequeno do que eu, na altura.
Dessa conversa, o instante que mais me tocou foi relatarem-me o que a mãe do pequeno, disse à minha mãe, no funeral: E quando o meu filho morreu, peguei nele ao colo e fui levá-lo à enfermaria, para não assustar os outro meninos.
Não sendo eu pai (mãe nunca serei, mas talvez os laços sejam ainda mais fortes) e não tendo o sabor e o saber de o ser, senti que nunca ninguém no mundo deveria passar por tal infelicidade! Nunca! E, num momento destes, ainda alguém ter o cuidado de pensar nos outros, de querer para eles o que queria para si e os seus e ter o cuidado de não assustar os outros meninos que estavam na mesma enfermaria!
Fartei-me de chorar.
Sem complexos. Nem vergonha. Nem tentativa de suster o que sentia.
Sim, os homens também choram.
quinta-feira, 3 de julho de 2008
Transcrições
Não digo que não possa acontecer, mãe. Mas não vai ser fácil. Estou mentalizado e preparado para ficar sozinho o resto da minha vida e, por estranho que lhe possa parecer, isso não me mete medo nenhum. Antes pelo contrário: talvez seja menos feliz ou a minha vida faça menos sentido, como a mãe diz, mas aprendi que assim tenho de certeza muito menos angústias e estou garantido contra sofrimentos e decepções que, a meu ver, também não fazem sentido. A verdade, mãe - e desculpe que lhe diga, mas a mãe é de outra geração - ... acho que não percebo as mulheres de agora. E não sei se quero ou se tenho interesse em tentar perceber.
(...)
Quero dizer, mãe, que para mim as coisas são simples: gosto ou não gosto, amo ou não amo. Se amo uma mulher, amo-a mesmo. Não tenho dúvidas, nem contradições, nem estados de espírito, nem outra vida onde ela não caiba. Para mim, que pouco percebo do assunto, o amor é sobretudo a ausência de perguntas, de dúvidas, de incertezas. É paz, segurança, eternidade. O meu pai nunca teve dúvidas se a amava ou não. Amou-a sempre, à maneira dele, que era a única que sabia. Amou-a uma vez, amou-a para sempre. Podia pôr tudo em causa, mas isso a mãe sabe que ele nunca pôs. E eu não percebo que as mulheres não pensem assim. Não percebo!
(...) o meu cavalo gosta de mim todos os dias. Compreende-me todos os dias, sabe o que eu quero e o mesmo se passa comigo em relação a ele. Se há um dia que eu não o monto, ele sente saudades de mim e todos os dias olha para mim como o seu melhor amigo.
(...)
Quem nunca sofreu por amor nunca aprenderá a amar. Amar é o terror de perder o outro, é o medo do silêncio e do quarto deserto, de tudo o que se pensa sem poder falar, do que se murmura a sós sem ter a quem dizer em voz alta. É preciso sentir esse terror para saber o que é amar. E, quando tudo enfim desaba, quando o outro partiu e deixou atrás de si o silêncio e o quarto deserto, por entre os escombros e a humilhação de uma felicidade desfeita, resta o orgulho de saber que se amou.
> Miguel Sousa Tavares, Rio das Flores, 1ª edição, Oficina do Livro, Lisboa, Outubro de 2007, p. 371, 372 e 583